(*) Marli Gonçalves –
…tudo, a luz, as estrelas, viagens, dinheiro… Acreditou? Do jeito
que todo mundo anda atrás de algo ou de alguém a se apegar, nem duvido
que tenha até chegado a imaginar as benesses que, infelizmente, não
estão nem ao meu próprio alcance. A procura por líderes e ídolos para
nos guiar, proteger, defender e ajudar continua a pleno vapor. Se antes
de mim você encontrar algum ou alguém que valha a pena promete me
avisar?
Vivemos procurando a tal luz no fim do túnel. A estrelinha Vésper no
firmamento. A última garrafinha de água no deserto. O Mestre Supremo e o
Senhor de todas as coisas. O Grande Orientador. Pior, também passamos a
vida achando que os encontramos, até que um tranco qualquer, em geral
alguma verdade, apareça e nos leve as ilusões, deixando-nos mais para
baixo que bico de gaivota quando mergulha para pescar. E lá vamos nós em
busca de novo, e de novo, acreditando nas promessas.
A necessidade de adorar e idolatrar, sei lá, imagino, não deve ser só
da gente que é gente, pessoa. Conheço gatos e, especialmente,
cachorros, que idolatram verdadeiramente seus donos, o que é visível em
cada um de seus atos. Acho que a diferença é que nos animais esse amor é
incondicional, e sobrevive até aos trancos de mau humor que possamos
ter com eles, que sempre estarão lá, babando, abanando o rabo, se
esfregando em nossas pernas. Será questão de memória? Temo que não,
porque também conheço casos de animais que guardam a raiva de alguém até
poder descontar, ou com uma bela mordida, ou com um bom arranhão.
Obviamente que esta semana andei rassudocando muito sobre tudo isso.
Rassudocar? Quer dizer pensar, imaginar. Não sei se já é termo aceito,
se é gíria, mas não tem palavra melhor para aquele pensamento que a
gente fica remoendo, que vai e que volta, que praticamente dissecamos e
cercamos até resolvê-lo por inteiro, ou mesmo esquecê-lo, o que também
pode ser de repente, quando a cabeça é invadida por outro tema. Para
escrever a gente rassudoca muito – creio que isso acontece com todos os
escritores e cronistas.
Enfim, rassudoquei sobre a loucura que circundou a visita do Papa
Francisco, definitiva e rapidamente eleito pelo Brasil como uma das
pessoas mais legais, simples, simpáticas, corajosas e carismáticas de
todo o mundo, de todo o Universo, quiçá. O que para um argentino,
venhamos e convenhamos, também beira um milagre. Ele veio pronto a
inspirar e colher essas paixões, ao falar e discursar, praticamente
dizendo tudo o que queríamos ouvir, à exceção de “Fora Cabral”.
Esperávamos por um líder, qualquer ser, que viesse nos ajudar com nossos
perrengues nacionais e particulares.
Daí fiz uma listinha do que é necessário para ser ídolo nestes tempos
atuais: dizer que compreende tudo, que está ouvindo as voz das ruas,
dos jovens, dos protestos, coisa que não sei se vocês repararam virou
mania nacional, mas já engolfada pela propaganda, a comercial e a
política. Tem uma, de refrigerante (!), que fala até em “batedores de
carteira honestos”, seja lá o que isso quis dizer. Até os partidos mais
reacionários estão vindo com essa conversa fiada, mostrando imagens e
sons dos protestos, e fazendo promessas com a cara candura de sempre.
Sem mudar nada.
Não me admira que tantos ídolos fiquem pelo caminho, demonstrando ser
feitos de barro, de ar, de vidro ou qualquer outro material de quinta,
inclusive moral e eticamente falando. Não me admira que haja tanto
desânimo e descrença, e aí reside o grande perigo de sempre: não existe o
vazio; ele pode ser preenchido por qualquer coisa que tampe o buraco.
Temos necessidade de ter ou ídolos, ou mestres, ou quem vá na frente
segurando uma vela. Isso não tem jeito.
Vejo quem sofre porque o Lula, “Noço guia supremo”, os “traiu”. E
também vejo quem fica até úmido quando o vê, e tampa os olhos, o nariz e
os ouvidos de forma impressionante quando se apontam fatos irrefutáveis
sobre seus desfeitos. Acontece. Tem quem se atarraque numa coisa e não
largue dela nem para se jogar junto, do precipício.
Perdi tantos ídolos nos caminhos da vida que hoje os evito; talvez
por isso perceba tão bem essa tendência a se enrabichar atrás de
qualquer coisa. A diferença é que o povo também não tem nenhuma
fidelidade e troca de amor sem nem trocar a camisa.
Estamos vendo isso na política. Sonhadores, por exemplo, pensando que
Joaquim Barbosa é mesmo o Batman. Que a Marina chega lá. Ou que Luan
Santana canta bem, e que tudo o que está acontecendo seria resolvido com
a volta dos que já foram, mas ameaçam afiar unhas, ameaçando os que
deixaram de venerá-lo, vendo sua verdadeira face.
Só que para combinar com o momento que atravessamos é bom lembrar que
para muitos a idolatria é considerado um terrível pecado.
Principalmente quando não há santo, nem para fazer milagres, nem para
fazer promessas, muito menos para a gente ajoelhar.
São Paulo, onde só falta nevar, 2013
(*) Marli Gonçalves é jornalista – Estou aqui a
cismar sobre qual será o próximo Mestre de todos os mares, quem será a
Diva de todas as divas que aparecerá por aqui, embora pense que tão cedo
poucos se aventurarão por essas plagas – de medo de ficar preso no
trânsito, debaixo de chuva e com um monte de criancinhas para abraçar e
beijar.
Tenho um blog, Marli Gonçalves, divertido e informante ao mesmo tempo, no http://marligo.wordpress.com. Estou no Facebook. E no Twitter @Marligo
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