(*) Marli Gonçalves –
Fico imaginando que logo receberemos em casa um buquê de flores,
podem até ser vermelhas, com um cartão perfumado e meloso e do qual
brotará uma foto de nossa presidente sorrindo, perdoando nossas
rebeldias, anunciando muitas medidas instantâneas, e até nos convidando
para um cafezinho coado no Palácio
Cruz Credo? Melhor do que antes quando imaginava o Zé Dirceu dando
palpite em tudo, aparecendo em todos os lugares e temia que, um dia,
quando eu abrisse o box do chuveiro para tomar banho, ele já estaria lá
dentro e sairia bradando alguma ordem, metendo o bedelho, sabendo de
tudo. Agora deram para invocar com a espionagem e bisbilhotagem norte
americana! Ó, surpresa! Ó, dó! Ninguém sabia disso. Nem imaginávamos,
não é mesmo? Daqui a pouco vamos nos surpreender ao saber que os russos
também nos ouvem, e nem combinaram com a gente, esses malvados.
E, como bons descendentes de portugueses que somos (eu sou, posso
falar), vamos aproveitar e fazer uma CPI para futucar bem, investigar,
gastar um pouquinho mais, afagar deputados e senadores, mudar o rumo da
conversa que estava muito em cima de uma tal Petrobras, da Copa (e
Olimpíadas). Aproveitamos para pisar e espalhar mais um pouco a coisa:
divulgamos aos quatro cantos que nosso governo trabalha descoberto, que
nem a presidente usa telefones especiais, que chanceler não fala com
chanceler; nem escreve e-mail. Pelo menos uns cinco empresários que
conheço andam totalmente blindados – de carros a telefones, muitos
celulares, constantemente checados, criptografados, cromados. Já a
presidente do país, não. Também! Já pensaram o custo de cuidar de 39
ministros e assemelhados? Comprar roupas que não sejam ternos xadrezes
com gravatas tortas para os nossos disfarçados arapongas?
Como gosto de dar bolas à imaginação, imagino os ouvidos americanos
tentando entender umas coisinhas que ouvem ou leem. Um homem do
marketing governando, criando bondades embaladas e maldades engarrafadas
para vender no horário nobre, tocar na Hora do Brasil. O ministro da
Educação e o seu vasto bigode Mercadante falando só de política, de como
vai ser promovido qualquer hora a papagaio de pirata chefe, como vai
ferrar de vez os adversários ali ao lado. Gilberto Carvalho
choramingando para o Lula (que só ele acha onde está) contando que está
sendo maltratado, sem amor, ninguém para rezar com ele. O tal Cardozo
Ardiloso da Justiça, mais perdido que bola de gude em dia de passeata,
tentando saber se alguém sabe de alguma coisa porque ele precisa fazer
cara feia e dizer que está tomando providências. Fora o coitado do
americano que patrulha o Afif, meio confuso. Ué, ele não é
vice-governador de São Paulo? Porque está ligando do Ministério? O
gringo só vai poder rir quando ouvir a conversa da Dona Marta, marcando
algum cabeleireiro, voo, manicure, prova de roupa, plástica, para se
disfarçar de pedra. Quem, eu? Governo? Eu? Protestos. Ah! Quando eu
assumir, junto com o prefeito de São Paulo, vou mandar verificar,
rigorosamente.
Eu ficaria horas imaginando. Mantega, Padilha, Narizinho, Ideli…
Alguém de vocês aí consegue imaginar como têm sido os dias de Dona
Dilma, depois de descobrir que montou um governo de trapalhões? Um
horror. Com um monte de gente na porta pedindo coisas, aproveitando as
fraquezas e querendo pisar no pé dela e arrancar unha encravada a sangue
frio. E a coitada tendo de ser simpática! Tomar decisões! E quando ela
vai em algum lugar assim, digamos, mais cheio de gente, e que ouve
aquele zumzumzum, com um som de Ú, constante? Ainda por cima, obrigada a
andar arrumada, maquiada,penteada. Óculos, ela não precisa. As
plaquinhas das ruas têm sido escritas com letras bem graúdas,
caprichadas na clareza.
Essa semana, dizem, Lula desceu lá da África e baixou na casa dela.
Será que ela viu que era ele, antes, pelo olho mágico? Porque o que ele
deve ter dado de conselho, o chato, porque esse é outro que acha que é
sobrenatural, sabe de tudo. Bate no peito: entende de um tudo, com uma
percepção anormal, sensibilidade de peão, porque subiu na vida. Bom,
precisaremos perguntar ao Obama sobre o que ambos conversaram, já que
como dizem ele estaria especialmente interessado no Brasil.
Sempre achei o Obama um cara bem humorado mesmo. O que deve receber
de informação engraçada! Rosimeire? Who? BNDES money, free? Renan Air?
What? What? What?
Mas tem uma coisa que a gente não pode negar. O apego de Dilma a Lula
só pode ser um sentimento lindo, aquele, e que podemos até aproveitar
para festejar bastante agora, dia 20 de julho, o dia desta maravilha que
é a amizade. Dia 20 é o Dia do Amigo. Daquele junto aos quais às vezes
nos calamos para não perdê-los; relevamos, perdoamos. Amigo que deixa a
gente muito aflito se não está bem. Amigo amigo, que é mais do que os
milhares de amigos que temos feito por aí, nas redes e na nuvem, que
adicionamos ou aceitamos. Embora saiba que às vezes muitos de nós temos
amigos virtuais mais próximos do que os de carne e osso, porque de longe
esses são sempre mais maleáveis como confidentes, dispondo só das
informações que nós próprios lhes fornecemos.
Como eu sou boa, muito boa, pessoa boazinha, vou dar uma força para
manter essa amizade que nos tem governado em dueto, o problema agudo é
que com muitos graves. Dilma, não briga com o Obama, que não é hora.
Fala com O Cara, não aumenta muito a pressão porque, sabe como são esses
espiões americanos, gente ruim, podem começar a espalhar algumas das
coisas que ficaram sabendo, ou que falam um do outro. E aí, amiga, quem
vai ter que se explicar e rebolar é você.
Lembre que não era a voz rouca das ruas que estava sendo espionada.
Tanto que surgiu e pegou todo mundo, literalmente, de surpresa. Vocês,
com a boca na botija.
São Paulo, bom dia a todos os ouvintes, 2013
(*) Marli Gonçalves é jornalista – Amiga. Mas anda perdendo uns
amigos por aí quando tenta mostrar que humor e bom senso é igual caldo
de galinha: sempre faz bem e ajuda a pensar. Ficam com raiva. Eu sou da
paz.
Tenho um blog, Marli Gonçalves, divertido e informante ao mesmo tempo, no
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